Sunday, November 09, 2008

Caos

Dá-me particular prazer o ritual quase semanal de pôr ordem no caos que é a minha mesa, seja pelo aspecto renovado com que fica após cada nova arrumação que deixa o tampo quase vazio, pelas coisas perdidas que encontro na velha desarrumação, pelas que não têm utilidade e deito fora ou pelas que não servem para nada e mesmo assim guardo. Encontro de tudo neste rectângulo de madeira de dois metros por setenta centímetros: um prato de cartão manchado de tinta ainda por secar, folhas soltas cheias de idéias perdidas, tampas de canetas que já secaram, fotografias velhas de viagens já feitas e de bons tempos passados há muito, pequenas caixas carregadas de memórias, um Buda tombado e o seu velho amigo de barba azul, paus de incenso queimados e uma caixa cheia deles por queimar, velas, caixas de fósforos, discos rígidos, uma ganza perdida, algumas moedas, revistas, livros, os meus livros de desenhos metafóricos cheios de ilusões com algumas invenções e carregados de sonhos nunca vividos, chaves e ainda uma lamela de aspirinas que nunca tomei e que insisto em guardar apesar de nunca estar doente. Há ainda toda uma parafernália de material de desenho que devolvo ao respectivo alojamento, os lápis de carvão e as canetas pretas de pontas finas e espessuras variadas na caneca da Suchard Express, os lápis de cor na caixa quadrada encarnada de cartão, no triangulo amarelo de plástico vivem os pinceis e na redonda transparente os marcadores, os lápis de cera entram para uma caixa de madeira que me lembro da vida toda e os tubos de gouache voltam para a caixa grande da Caran D´Ache “roubada” à minha irmã. No fim fica tudo arrumado no seu sitio como cada macaco fica no seu galho, mas passados poucos dias e por mais que eu arrume ou esfregue ele, o caos acaba sempre voltar. O que acho é que ele nunca chega a sair e que eu faço tanto parte dele como ele de mim. A única coisa que tenho pena é que seja só aqui dentro.

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