Graphic designer, ilustrator with a pseudo-artistic vein. I try to earn my living as a freelancer while I depict the world as I see it, always with the hope that some charitable and enlightned soul ( who knows, maybe both) likes my work. There are two things I can´t live without since I was a kid, music and waves. I´m still a kid today with none or little will to grow up. Maybe someday that will happen, but until then, I´ll continue to unveil my world of lines, color and fantasy.
Tuesday, December 16, 2008
Carta de (re)Apresentação
“Tu e o Pi durante estes nove dias só vão fazer sobremesas”
Foi com esta frase ouvida em Março deste ano, em vésperas de um evento desportivo conhecido da nossa praça que a minha vida profissional começou a mudar de rumo. Antes desse evento já tinha trabalhado em cozinhas, cheguei mesmo a fazer um estágio de 3 meses na cozinha de um dos melhores hotéis de Lisboa há mais de dez anos, no fim do primeiro ano de Gestão Hoteleira e nos primórdios da minha experiência universitária. Findo esse longínquo e esgotante Verão de trabalho decidi que cozinhas, hotéis e afins não eram para mim. Desisti do curso acima referido nos primeiros meses do segundo ano. Nem eu sonhava na altura que esses três meses “perdidos” de Verão, com uma passagem de duas semanas pela pastelaria, me iriam ajudar numa fase mais ou menos adulta da minha vida: esta em que vivo e estou agora, o presente e o dia de amanhã.
Antes desse evento já tinha trabalhado com amigos em caterings e até mesmo feito uns bolos aqui e ali. No momento em que me disseram essa frase reparei que o problema não seria fazer as sobremesas, mas sim, fazê-las para o número de pessoas que supostamente as iriam comer, à volta de trezentas, todos os dias durante nove. Não só teria que aprender a fazer a longa de lista de sobremesas “in location and with a tight schedule”, como as teríamos que produzir ao frenético ritmo de uma linha de montagem de uma qualquer fábrica chinesa. Trocados por miúdos, tinha que me transformar de aprendiz em mestre pasteleiro em menos de um ápice. O problema é que eu nem o Pi sabíamos o quer que fosse de pastelaria, à excepção de saber fazer o já mencionado bolo de chocolate ao que se juntavam também brigadeiros. Nunca tinha feito um cheesecake, não sabia que aos dois pacotes de bolacha maria moída se juntam 175g de manteiga derretida, não fazia a miníma ideia que depois essa base ia ao forno pré-aquecido a 175ºC durantes 10 minutos. Jamais tinha derretido gelatina para juntar às mousses, nem tão pouco sabia que tinha que o fazer com um pouco de água porque senão aquela treta agarra-se toda ao funda panela. E também não fazia a mínima idéia que as natas para bater só levantam se estiverem bem frias, e que as tinha de esconder da Dona Fátima porque senão ela não teria qualquer problema em nos esgotar o stock para usar no seu bacalhau com natas. Posso dizer-vos que menos de um ápice, neste caso particular, foram dois longos e penosos dias em que os cheesecakes se desmoronavam, em que as mousses não passavam de líquidos sem qualquer tipo de consistência e em que os bolos de chocolate não desgrudavam do fundo da forma. Como nós costumamos dizer: foram dois dias no lodo. Eu e o Pi enfiados até ao pescoço num pântano de natas, açúcar, chocolate e mais uma data de merdas doces e pegajosas a tentar ao mesmo tempo empratar os bolos que tinham que sair para a sala, preparar mais para serem feitos e não deixar queimar os que estavam no forno. Junte-se a isto tudo uma boa dose minha desorganização e da javardice do Pi, assim como a necessidade de manter a nossa área de trabalho limpa e conseguem ter uma noção do cenário de guerra onde estávamos metidos: muito fundo na mais profunda, suja e pegajosa trincheira. Passados esses dias iniciais a coisa lá se compôs e o começámos a carburar melhor, produzindo à volta de trinta bolos e tartes por dia e ainda mais umas litradas de mousses em que se incluí uma horrível e falhada experiência de mousse de jaca. Conseguimos arranjar método de trabalho e de limpeza para superar a prova com distinção e chegar ao fim dos dias com bolos em stock para o dia seguinte. Os últimos dias de navegação foram bastante mais tranquilos e a secção da pastelaria foi rotulada de maníaca devido às doses cavalares de doces que produzia.
O segundo grande evento foi em Setembro em Portimão. Quer dizer, não foi um mas sim dois eventos de penalty: 5 dias de preparação e montagem, 9 dias de evento (regatas de barcos à vela), 2 dias de intervalo, 3 dias de preparação e 5 de evento (regatas de barcos a motor). Antes de desenvolver mais este assunto convém sublinhar uma coisa: os gajos da vela comem que nem animais. Nós tínhamos que alimentar uma manada com uma média de mil estomâgos por dia, mais coisa menos coisa. Estômagos esses que eram grandes e vorazes e que não faziam qualquer tipo de cerimónia quando o assunto se referia a desmontar saborosa comidinha a um ritmo galopante. O problema inicial era não só o número de pessoas a alimentar mas também as diferentes frentes de batalha em que estávamos envolvidos. Ora então vejamos: pequeno almoço para Vip´s, catering para barcos de patrocinadores e organização, almoço de staff (buffet), cocktail para Vip´s e jantar de staff (buffet), todos os dias a que se juntam dois jantares para 500 no fim de cada evento. Eu que tive uma abençoada cunha que me livrou da tropa, considero este mês de Setembro como o meu mês de recruta. Fomos verdadeiras e letais máquinas de guerra movidas a cafeína e taurina (Red Bull) e treinadas para produzir comida para um exército de porcos. Dormíamos uma média de 4 horas por dia, trabalhávamos para lá de sol a sol ao melhor estilo escravatura colonial. A única diferença era que éramos remunerados e bem para exercer as nossas funções. O Pi e eu chegámos inclusivamente a fazer uma directa porque não tínhamos nada em stock para o dia seguinte. Só nessa noite fizemos à volta de 25 bolos, 10 litros de Pana Cotta, 10 litros de mousse de framboesa e cozemos 160 chapatas. Agora imaginem dois obcecados alunicados, às 4 da manhã a passar essa mesma mousse para mangas de pasteleiro e depois a tentar fechá-las. Nessa longa noite e depois de uma escorregadela por pouco o meu “partner in crime” não me furou de um lado ao outro com a faca com a lâmina mais comprida da cozinha, a do presunto. Testemunhei ainda uma cena hilariante nessa mesma noite enquanto fumava um cigarro na rua: um imponente segurança que se deslocava num Segway (aquelas merdas de look sci-fi que rolam por ai), quando me vinha interpelar para saber o que eu fazia ali a tão avançada hora da noite não reparou no grelhador de metal que estava no chão e mandou um baldo voador e de proporções dantescas vindo aterrar, literalmente, a meus pés. Se eu quisesse tinha-lhe apagado a beata na testa mas achei que a enorme queda já tinha sido, por si só, suficientemente humilhante. Escusado será dizer que depois daquilo a autoridade do rapaz ficou como ele: rente ao chão e estilhaçada. De uma forma geral a vida da secção da pastelaria foi “tranquila” e nunca faltaram os docinhos para os nossos leitõezinhos. Só fazíamos doses de oito ou mais bolos ao mesmo tempo, ou seja, as doses são em quilos e não em gramas. Não queimei nenhum bolo e fazia facilmente mais de quarenta por dia, à excepção de 4 bases de bolacha que estorricaram não por minha culpa mas porque o cabrão do forno tinha o termostato avariado. Não houve cheesecakes a ruir nem mousses liquidas. Aprendi a fazer mais uma data de doces que ainda não tinha feito e aprimorei-me a fazer os que já sabia. Foram semanas extenuantes e muito stressantes, que culminaram no último dia quando se abateu um tempestade de dimensões megalómanas in fucking Hellgarve, não permitindo a realização das regatas previstas para esse dia. Long story short: os meninos ficaram o dia todo na tenda a enfardar comidinha enquanto a cozinha ia metendo água. Foi horrível...
Agora perguntam vocês: “Como é que um gajo que se apresenta como designer gráfico e ilustrador acaba a fazer bolos?”
Tive que arranjar uma maneira de ganhar a vida porque não tinha paciência para lidar com briefings e/ou clientes, nunca gostei de fazer os chamados trabalhos corporativos e muito sinceramente, nunca quis ser maquetista. Consegui assim preservar o pouco que me resta de sanidade e a minha criatividade, que ultimamente tem andado na mó de baixo, para em termos de design gráfico e ilustrações fazer só o que me dá na real telha. Ganho a vida de uma maneira original e ganho muito melhor do que quando fazia BTL no departamente de design gráfico da Leo Burnett ou quando fazia pós-produção de fotografia num estúdio de imagem. Consigo ter tempo para mim, para fazer o que realmente gosto e gosto de fazer o que me dá dinheiro. Às vezes não tenho muita paciência mas também são raras as pessoas que a têm todos os dias para o seu trabalho. Muito sinceramente não acho difícil fazer bolos e produzir os mesmos em quantidades astronómicas, apenas sigo as receitas e as intrucções que vêm com elas, mas talvez tenha jeitinho para a coisa. Não me considero pasteleiro porque respeito muito essa profissão, já que para o ser a sério é preciso perceber muito da coisa e eu só ando nesta vida há menos de um ano. Nunca fiz um palmier na vida, nem tão pouco sei a receita, mas pelo aspecto da coisa não deve ser muito difícil. Também nunca fiz pastéis de nata, o meu doce preferido, mas é uma questão de passar uma tarde debruçado a lambuzar sobre o assunto. Já não sou designer gráfico freelancer. Sou apenas e só, um tipo que gosta de fazer umas bonecadas e escrever umas parvoeiras de vez em quando e que para muitos não fazem sentido, mas que para mim fazem todo. Repito, não sou pasteleiro mas sim um gajo porreiro que vai ganhando a vida a fazer bolachas, bolos e docinhos. Como é Natal aceitam-se encomendas de bolo-rei. O meu nome é João.
:)
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5 comments:
Depois de um dia estafante passado a tratar dos outros (de manhã) e a ver netos em teatrinhos natalícios (à tarde), nada me traria força para rir a não ser as suas descrições culinárias.
Mil beijos e, já agora, traga um bolo de chocolate para o jantar de Natal.....Mommy
Sure thing, love.
Deixa-me te dizer que doce mesmo é esse primeiro comment!
"netos em teatrinhos natalícios" traz-me muito boas memórias!
Quanto ao teu post:
1º
mais uma vez acho indecente falares de Pana Cotta. Não é justo. Já da outra vez era as framboesas, agora uma das minhas sobremesas preferidas e que não faço a mínima ideia como se faz, o q me obriga a ir a restaurantes italianos só para a comer.
2ºCorrer por gosto não cansa. Esses eventos podem ter sido infernais e com um ritmo alucinante, mas deram-te um gozo imenso.
3º, e na sequência do 2º
É muito importante que se faça da vida aquilo q se gosta, seja design gráfico, seja pastelaria.
Por isso, considera-te um homem de sorte!
Pana Cotta - ferver natas com leite e juntar extracto de baunilha. Juntar gelatina. É facílimo.
Sim, esses eventos são infernais e desgastantes mas são uma grande risota. E tens toda a razão, tenho muita sorte. :)
oh, pois, facílimo. Assim vindo de quem sabe, claro!
e medidas?? Quanto de natas para quanto de leite para quanto de gelatina para dose para quantas pessoas (não vale doses como as dos eventos, q a minha casa é pequenina!)
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